quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Autenticidade e inautenticidade existencial

A dificuldade de responder à exigência de "ser eu próprio" e sua relevância no projecto vital de cada homem fazem da busca da existência autêntica um dos temas abordados com mais frequência nas consultas de Aconselhamento Filosófico.

“A noção de inautenticidade tem grande relevo nos filósofos da existência. Já o advertimos. Heidegger considera uma inevitável estrutura humana a ‘queda na inautenticidade’: é a situação do homem que vive exclusivamente do ‘se’ (diz-se, faz-se, etc.), actuando sem assumir pessoal e originalmente o seu projecto vital, mas deixando-se simplesmente arrastar pelos condicionalismos vitais e sociais. É óbvio que essa existência perde assim grande parte do seu valor. E é também então quase óbvio formular que deve tratar de reencontrar a sua autenticidade.
Provavelmente, o conceito provém da moderna Psicologia profunda. (…) Lersh define autenticidade e inautenticidade como os dois modos (positivo ou negativo) de integração ‘vertical’ do fundo endotímico com o eu superior. Consequentemente, a vontade pode ser dita autêntica, quando a sua decisão ‘chega ao fundo’, quer dizer, arrebata consigo o fundo endotímico, integrando-o. O mesmo poderemos dizer do pensamento, enquanto ‘convicção’. São causas de inautenticidade as pressões da convivência social; assim como uma tendência à notoriedade, especialmente vigente em certos indivíduos. Em geral, a conduta psicologicamente inautêntica acusa pobreza de fundo. A solução está na busca da integração, que deverá começar pela aceitação da própria realidade tal como ela é.
(…) Radicalizando estas reflexões até torná-las ‘existenciais’, encontramos como definição de autenticidade a fidelidade ao próprio projecto vital. Isto supõe um duplo elemento: primeiro, a não abdicação da própria originalidade pela qual o projecto é projecto: o que verdadeiramente vive no homem, o seu enfrentar da realidade ‘desde si mesmo’, ao contrário do animal, que vive simplesmente entregue aos estímulos, respondendo-lhes segundo as leis específicas e as peculiaridades da circunstância externa.
Em segundo lugar, a autenticidade existencial supõe que o projecto vital que cada homem é está, de algum modo, dado no mesmo homem previamente à sua decisão. Uma decisão forçada contra o próprio fundo do homem, fá-lo inevitavelmente inautêntico. O homem tem que conformar-se consigo próprio. Heidegger, no final de algumas das suas análises em Ser e Tempo recorda o ‘sê tu próprio’, pronunciado tantas vezes pela diversas escolas morais."
José Gomez Cafarena, Metafísica Fundamental